O Anjo-Vampiro

Na casa dos tios de Elisabeth, o casal está tomando seu café da manhã, pensativos sobre os perigos do destino da sobrinha.

- Acha que ela está bem? (indaga a tia Joana ao marido).
- Espero que sim! Afinal o tal sujeito é um anjo! (responde o senhor Jones).
- Não sei como ele poderá lutar contra estes... demônios! Até quando isso continuará? Como sobreviverão fugindo desse jeito?

- Este assunto está agora nas mãos de Deus! Se ele enviou um anjo para protegê-la, nenhum demônio poderá fazer-lhe mal!

Agora eles olham para fora, pela janela que está ao lado e veem uma enorme criatura com asas negras pousando na rua à frente de sua casa.

- O que é aquilo? (indaga, Jones, assustado). Vou pegar a minha arma!

Sua esposa olha assustada para fora quando vê outra criatura alada, com enormes asas brancas pousando entre a casa e aquele que acabara de chegar. Lá fora o anjo protetor confronta o oponente:

- O que está fazendo aqui? Sabe que numa casa com anjo protetor, nenhum mal pode se aproximar!

A criatura é grande, forte e de aparência humana. Mas tem um olhar penetrante e muito ameaçador. Ele dá um leve sorriso sarcástico enquanto caminha lenta e confiante na direção do anjo.

- Fique tranquilo... só quero conversar com o casal!

O anjo saca sua espada de lâmina brilhante e a posiciona de tal forma que a luz do sol se reflete nela diretamente nos olhos do demônio. O anjo ameaça:

- O que pensa que está fazendo em plena luz do dia? Quer que as pessoas nos vejam assim? Não se aproxime!

Sem demonstrar medo ou incômodo pela forte luz em seus olhos o demônio continua caminhando e responde:

- Não acha realmente que pode me deter, não é? Basta sair da frente que ninguém se machucará!

O anjo toma posição de ataque, flexionando os joelhos e se preparando para a luta.

- Pare, Lúcifer! Ficou completamente louco? Não podemos lutar em terra! É contra as regras.
- Esqueça-se das regras. Tudo mudou agora! Em breve eu determinarei novas leis para humanos e anjos.

Ao dizer isso, Lúcifer saca também a sua espada brilhante e ataca o anjo que se defende. Flashes rápidos de luz brilham mais intensamente a cada impacto das lâminas celestiais. As espadas giram rapidamente no ar num frenesi de impactos e luzes. O senhor Jones abre a porta da casa e aponta a arma na direção do demônio, mas a velocidade da luta e os movimentos agitados daqueles anjos em luta, tornam a mira quase impossível.

- Não atire! (grita a esposa, também saindo lá fora). Pode acertar aquele que nos protege!

Na luta os anjos se movimentam pela rua. Suas espadas cortam árvores próximas, destroem alguns carros estacionados ao lado, arrancam telhas, cortam paredes como se fossem feitas de margarinas. As pessoas começam a sair de suas casas para verem o que está acontecendo. É inacreditável. O bem e o mal estão lutando diante de seus olhos. Uma luta feroz, violenta, destruidora e difícil de se olhar diretamente. A cada impacto das espadas fortes luzes são emitidas para todos os lados. Praticamente não dá para se abrir os olhos.

- Pare com esta insanidade, Lúcifer! Não pode se expor desta forma! Terá uma grave punição por isso.
- Eu não sigo as regras de Deus! E em breve até Ele terá que aceitar as minhas novas leis.

Ao dizer isso o anjo caído desfere um forte golpe que arranca a espada do anjo. Ela é arremessada para cima e cai com força sobre o solo, fincando-a fundo no meio da rua. Um jato de água começa a esguichar para cima. Um cano d'água fora atingido e muito líquido se espalha com força para cima, molhando tudo ao redor.

Lúcifer avança contra seu oponente de asas brancas e com a mesma mão que segura a espada, desfere um soco no rosto do anjo que cai de costas com força contra o solo. A criatura de asas negras dá mais um passo à frente e aponta a lâmina brilhante na direção do pescoço desprotegido do enviado celestial. Ele olha na direção do senhor Jones que aponta a sua arma e atira contra Lúcifer. A bala acerta seu ombro e o atravessa. Mas rapidamente o furo se fecha para espanto do velho homem. O anjo negro olha para ele e lhe faz uma pergunta:

- Acha mesmo que humanos podem me machucar?

Nenhuma resposta vem do casal, atônitos como tudo o que acabara de acontecer.

- Só vim até aqui para saber para onde Elisabeth foi com aquele anjo? Respondam ou eu matarei este outro aqui.
- Não pode matar um anjo! É um pecado mortal! (responde aquele que está deitado ao chão de costas com a ponta da lâmina sobre seu pescoço).

Lúcifer olha para baixo, de volta para seu oponente vencido, e responde:

- Acorde anjinho! Não percebeu que tudo mudou? Acha que eu estaria aqui se não tivesse uma carta na manga? Meu exército de demônios está à caça de Elisabeth. Mas o outro anjo está pedindo ajuda aos vampiros para me confrontar. Eles escaparam temporariamente, mas assim que eu os encontrar tudo irá mudar. Enquanto isso, centenas de humanos já foram mortos por culpa de Eliseu. Milhares de outros em breve também serão, se não me entregarem a Curandeira. Vocês anjos, tão presos às regras celestiais, estão a um passo de serem banidos do Firmamento. Estão quebrando tantas regras que serão todos expulsos do céu e eu nem precisarei lutar contra vocês depois disso. Todos morrerão antes de poderem me deter. Agora... pela última vez... onde o casalzinho foi se esconder e quem mais estão recrutando para lutar contra mim? (indaga Lúcifer olhando na direção do senhor Jones e Joana).

- Não sabemos! Eliseu não nos disse onde iriam e nem o que fariam. A intenção dele era nos proteger e agora entendo porquê!

- Protegê-los?! Se ele achou que um anjo de segunda linhagem poderia protegê-los... então é porque já não está muito bem de saúde mental e em breve será vencido pelos limites que Deus impôs aos anjos. Muito bem... Vejo que nenhum de vocês sabe exatamente o que está acontecendo! Parece que Eliseu está agindo a revelia das regras divinas! Ao menos ele percebeu que jamais poderão me vencer seguindo tais determinações. Que bom! Parece que terei uma luta melhor do que a que acabo de ter com você (Lúcifer agora olha na direção do anjo aos seus pés). A propósito, sabe que por se expor para todas as pessoas daqui, acaba de se tornar mais um anjo caído, não sabe? Que tal trabalhar para mim agora?

- Rsrsrs! Não seja ridículo! Isso jamais acontecerá! Prefiro ser morto a servir um demônio louco feito você!

Lúcifer sorri ironicamente, afasta a espada do pescoço de seu oponente vencido e dá um passo para trás.

- OK! Escolheu seu destino, anjo. Irá morrer entre os humanos muito em breve, seguindo as regras morais que segue! Tenha uma boa morte.

Ao dizer isso, Lúcifer se vira de costas e desaparece em pleno ar. As pessoas na rua olham para aquela cena inusitada e lentamente vão se aproximando da casa do senhor Jones. O anjo de asas brancas se levanta, vai em direção à sua espada e a arranca com facilidade do solo. O jato de água aumenta consideravelmente molhando-o e às suas asas. Ele as recolhe para o interior de suas costas e sob o casaco que usa. O anjo vencido e todo molhado de água, caminha em direção ao casal idoso. Ele demonstra estar abatido e cansado. A dona Joana aproxima-se dele e lhe faz um carinho num dos ombros.

- Obrigada por nos defender! Você foi muito corajoso.
- Eu não os protegi! Fui vencido e me expus aos humanos. Lúcifer tem razão! Acabo de ser banido do céu por conta de tudo isso! Não posso mais protegê-los. Estou me tornando humano, com todas as necessidades e as deficiências. Por outro lado, o mal não deverá retornar até esta casa por enquanto.
- Sinto muito! O que pretende fazer agora?
- Tenho que ir atrás de Lúcifer! Ele tem que ser contido. Mas agora preciso tomar um pouco de água e descansar.
- Claro, claro! Venha! (convida a dona Joana). Entre aqui e sente-se. Vou pegar uma toalha para se enxugar e um copo de água para você!

O senhor Jones, ainda com a arma nas mãos, olha ao redor para a pequena multidão embasbacada. Ele vira-se de costas para todos, entra em casa e fecha a porta.

- Acha que agora não sendo totalmente anjo, poderá lutar contra alguém tão poderoso, quando Lúcifer?
- Claro que não! Mas isso não me impede de tentar!
- Não tem como acionar outros anjos para te ajudar?
- Nenhum anjo agora ouvirá meus chamados. Estou sozinho e com tempo limitado de vida para realizar o que preciso!
- Meu jovem. Na vida precisamos saber quando desistir de uma luta!
- Concordo! Mas a vida que eu tinha se acabou! Não sou mais um anjo do Firmamento. Estou liberado para fazer o que for preciso, mesmo que seja o meu último ato!
- Como podemos lhe ajudar?

A dona Joana lhe trás o copo d´água e a toalha. Ainda um pouco ofegante, ele enxuga o rosto e bebe a água.

- Vocês já ajudaram mais a mim do que eu a vocês! Sou-lhes muito grato! Obrigado. Mas tem algo que ainda poderiam fazer por mim: eu preciso de um par de binóculos. Por acaso o senhor tem um?
- Você deu sorte rapaz! Tenho um modelo top de linha aqui. Espere um minuto.

O senhor Jones se afasta dali e vai até seu escritório, uma das portas da casa. Enquanto isso a esposa dele indaga o anjo:

- Sabe se a minha sobrinha está bem?
- Eu perdi o contato mental com Eliseu assim que seus vizinhos vieram ver a minha luta no meio da rua com Lúcifer. Mas até aquele momento eu sei que ela estava bem!
- Que bom! Fico mais tranquila.

O senhor Jones retorna agora com os binóculos e mostra como ele funciona para o anjo caído:

- Meu rapaz! Tome cuidado com este equipamento! Ele é muito sensível. Quando você utilizar o zoom para ver algo de muito longe, o sistema de escuta à distância entra em ação. Se colocar o fone de ouvido, que fica aqui do lado guardado, poderá ouvir tudo como se estivesse próximo do que observa. Então poderá até ouvir o que as pessoas falam.

- Isso me será muito útil, senhor Jones. Agradeço a sua atenção. Sugiro que mudem de endereço até tudo isso terminar! Porém não posso garantir o resultado final!
- Deus há de nos proteger a todos!
- Espero que tenha razão, senhora! (responde o anjo).
- Que Deus tenha piedade de todos nós! (responde a bondosa senhora diante de mais um anjo caído).