O BARCO INVISÍVEL - MISSÃO-FANTASMA - VOLUME I
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INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I
A MISSÃO-FANTASMA

CAPÍTULO III
A VISÃO DO INVISÍVEL


Pouco tempo depois lá estou eu viajando de avião militar de Brasília para Manaus. Uma longa viagem sobre o tapete verde amazônico! Isso me faz pensar o quanto é grande o Brasil! O quão pouco sabemos sobre tudo o que acontece diante de nossos olhos!

Se um barco militar pode ser invisível, o que mais pode existir convivendo próximo de nós sem que saibamos com certeza o que está acontecendo?

Se a tecnologia atingiu tal nível, então nenhum de nós está livre de ser espionado de uma forma ainda mais próxima. Talvez muito em breve uma pessoa possa estar ao meu lado, totalmente invisível aos meus olhos, ouvindo tudo o que falo e vendo o que escrevo ou insinuo.

CAPÍTULO II
A BASE DE OPERAÇÕES

CAPÍTULO III
A VISÃO DO INVISÍVEL

CAPÍTULO IV
NAUFRÁGIO NOTURNO

CAPÍTULO V
O ATAQUE DOS FANTASMAS

CAPÍTULO VI
UMA AMEAÇA INVISÍVEL

Quem sabe até mesmo com uma arma apontada para mim, enquanto pego o telefone para dizer algo que talvez não devesse. O mundo está ficando muito perigoso! A invisibilidade com fins militares pode degenerar as relações internacionais e até mesmo acabar com o futuro da sociedade humana! Estou aqui apenas para observar e relatar tudo para o futuro. Mas tenho a impressão de que não será nada fácil acompanhar esta missão.

-
Atenção, senhores! Vamos passar por uma zona de turbulência. Peço que fiquem tranquilos, porque está tudo sob controle.

Aquilo me faz pensar que um avião invisível poderia nos abater naquele momento e todos pensarão que a queda fora causada pela tal turbulência. Acho que estou exagerando! Será que tudo isso pode realmente estar acontecendo? Estaria o mundo preparado para uma guerra de invisibilidades? Tanques e soldados marchando em silêncio destruiriam uma cidade inteira, matando toda e qualquer resistência ao avanço militar! Aviões e navios atacando pelo outro lado só seriam visíveis quando estivessem bem perto e atirando contra seus alvos. Líderes políticos, religiosos ou sociais seriam mortos por pequenos grupos militares infiltrados e nunca ninguém saberia exatamente o que aconteceu! Não consigo deixar de pensar de forma pessimista! Não vejo como esta nova tecnologia poderia ser útil para a evolução da humanidade! A turbulência começa e posso notar na fisionomia dos jovens soldados que a maioria está preocupada, mas alguns se divertem com aquilo. Bastou um novo solavanco mais forte em pleno ar e agora o humor geral fica mais abalado. Noto que o avião se inclina e o piloto fala novamente a todos a bordo:

-
Atenção, senhores! Estamos fazendo uma pequena mudança de rota para desviarmos da forte turbulência existente nesta região.

Lá estamos nós aumentando o tempo da viagem desgastante que acontecia apenas em minha mente. Resolvo então começar a escrever. Pego meu tablet, de dentro de minha mochila acomodada no assento ao meu lado, já que o avião militar não está cheio o que me deixa à vontade ali. Escrevo sobre a entrevista inicial que tive com o Almirante Figueiredo.

Distraído em meus pensamentos e no novo trabalho jornalístico que eu começava a desenvolver, nem percebo quanto tempo passou. Escrevo a respeito de meus receios e impressão inicial sobre o tema invisibilidade. Observo fotos e informações gerais sobre alguns barcos Stealth americanos e percebo seu design diferenciado e cheio de ângulos.

Aproveito para estudar via internet a história das batalhas humanas. Levanto todas as informações sobre as tentativas do homem em camuflar seus armamentos, soldados e veículos de guerra e descubro o quão antigas são estas atividades, desde o tempo que caçávamos para sobreviver neste planeta!

Na hora que me resta, estudo o mais detalhadamente possível o provável percurso que faremos pelo Rio Solimões até a tríplice fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia. Aproveito para conhecer um pouco mais sobre os principais municípios existentes às margens do maior rio do mundo e também sobre os seus recursos naturais.

-
Atenção, senhores! Estamos nos aproximando do aeroporto militar de Ponta Pelada em Manaus. Apertem seus cintos e relaxem. Em poucos minutos estaremos em terra!

Ouvir isso foi um alívio! A longa viagem está sendo muito cansativa e a paisagem gigantesca nos remete a pensamentos incômodos sobre a possibilidade de queda do avião no meio do nada. Agora estou ansioso para conhecer o meio de transporte náutico em que eu trabalharei nos próximos dias.

Ainda no aeroporto um sargento se apresenta a mim:

- Olá, Fernando! Bem-vindo a Manaus! Sou o sargento Guilhermino. Nosso comandante da base de Manaus requisitou que eu o escoltasse até o porto militar secreto. O senhor terá acesso à nova embarcação da marinha brasileira.

- Sim, sargento! Obrigado!

Entramos num jipe do exército e vamos até o porto da marinha que fica próximo dali. Mal posso segurar minha ansiedade! Depois de passarmos pelas instalações do aeroporto entramos por uma estrada de onde eu posso ver um campo de futebol de piso azulado, exclusivo dos militares ali à direita. Mas logo depois entramos à esquerda por dentro da mata fechada num verdadeiro off road por estrada de terra e muitos galhos batendo no pára-brisa. Como qualquer bom repórter faria, pergunto a ele:

- Sargento, por que estamos entrando por esta picada sob a mata?

Ele sorri e me diz:

- Ninguém sabe que temos um porto da marinha escondido sob as árvores neste local. Via satélite nada se vê aqui. Ele foi construído especificamente para abrigar a nova embarcação Stealth brasileira, quando em missão secreta na Amazônia.

Rapidamente chegamos ao tal local secreto coberto pela copa de enormes árvores. Estranho ver um porto seco e pequeno para abrigar um barco militar de tão importante relevância!?!? Olho ao redor e nada vejo. Nenhum movimento! Nenhum barco! Ninguém vivo no local além de mim, o sargento e som de pássaros e macacos escondidos na mata.

Questiono-o novamente:

- Onde está o tal barco, afinal?

- Não tenho mais informações disponíveis, Fernando! Só me pediram para trazê-lo até aqui! Você deve aguardar a vinda do
barco e da tripulação. Se precisar me acionar, ligue-me (disse ele me dando um cartão de visitas).

- Ok, sargento! Vou aguardar.

O militar entra novamente em seu jipe, faz a volta e parte pela estrada a fora. Fico olhando o veículo se distanciar e desaparecer no meio da mata. Olho de volta para o porto vazio e noto o chão de terra batida. Logo à frente um pequeno braço do rio.

O ambiente do porto mal construído é meio escuro sob as enormes árvores amazônicas. Não entendo como um barco poderia entrar ali, naquele chão de terra. De repente começo a ouvir um barulho de algo na água se mexendo ali perto.

O som puro e suave vem de um pequeno redemoinho que se forma nas águas próximas. Estranho aquilo e me aproximo lentamente do local. Como num sonho vejo uma lindíssima mulher amarelada e brilhante que emerge lentamente das águas escuras.
Não acredito que estou vendo tal coisa! Parece ilusão! Algo inconcebível! Minha curiosidade jornalística faz com que eu me aproxime mais do local. A linda mulher coloca então para fora das águas as suas enormes asas também amareladas para meu espanto!

Ela bate-as freneticamente como uma libélula, tentando escapar do ambiente líquido. O forte som das poderosas penas batendo na superfície do rio me deixa perplexo com o fato. O que é aquilo, penso eu? O que está acontecendo?

A mulher revela-se por inteiro quando consegue alçar voo. Paira por ali mesmo mostrando que se tratava..., acho eu..., de uma sereia alada! Metade superior de uma mulher nua e metade inferior com cauda de peixe.

Além disso, o estranho e belo ser tem asas de anjo! Incrivelmente ela pisca para mim e sorri lindamente. Ouço nitidamente o som suave de sua risada leve sob as fortes batidas de asas. Agora ela voa em alta velocidade e em ziguezague para longe de mim, penetrando na mata fechada da floresta ao fundo. Uma visão incrível!

Ainda boquiaberto vejo uma porta
corrediça se abrindo em pleno ar.
Abaixo dela diversos retângulos,
uns sobre os outros, se articulam,
rotacionando-se para fora,
formando assim uma escada de
acesso.

O barco invisível começa agora a
se revelar lentamente diante de
meus olhos, exatamente no local
onde eu vira a aparição da “mulher
anjo-sereia amarelo brilhante”. A
imagem da floresta ao fundo vai
desaparecendo suavemente, e
surge agora completamente, e
diante de mim, o enorme veículo
naval Stealth brasileiro.

É exatamente igual ao que eu vira
na base secreta em Brasília, porém
parece ser um pouco mais alto.
Dou um passo involuntário para trás,
diante do tamanho susto que levei.
Não sei o que me impressiona mais neste momento. Parece que fui abduzido por um ET e estou vivendo uma estranha história de ficção impossível!

A porta e as escadas ocupam uma estreita região vertical da lateral inclinada da embarcação, que se inicia sob a porta recém-aberta e vai até a parte debaixo do barco. A escadaria formada era o convite para a minha entrada oficial ao interior daquela maravilha inesperada. A escada estava ali, bem perto do piso de areia onde me encontro. Um marinheiro aparece naquela porta, acena e me convida com um gesto a entrar.

Ainda meio aturdido com todo o ocorrido e impressionado com tudo o que vi até agora, subo pela lateral inclinada num ângulo próximo de sessenta graus! Ao chegar mais perto do topo, já no meio do percurso da escalada, o marinheiro grita para mim:

- Bem-vindo ao meu estúdio de televisão particular!
- O quê? Estúdio? (respondo a ele enquanto ainda subo as escadas)
- Sim! Ou você acha mesmo que viu um anjo em forma de sereia te paquerando agora há pouco?
- Então... aquilo foi... quero dizer... era uma imagem? Mas parecia tão real o som das asas..., da água..., do sorriso dela!

- A ideia é exatamente essa! Tudo nesta embarcação serve para camuflar e enganar todos que estão do lado de fora. Este barco é a maior tela de TV de alta definição do mundo! (comenta ele, falando mais baixo porque agora estou cada vez mais próximo de encontrá-lo).

- Estou realmente impressionado! (declaro eu, Fernando). Quase acreditei que tudo era verdade, não fosse o exagero de uma sereia-anjo amarelo-brilhante voando, eu talvez tivesse sido totalmente enganado.

- Você foi enganado, meu amigo! Eu vi sua cara de espanto e perplexidade em close-up aqui de dentro da embarcação! Achei até que estava ficando interessado pela minha amiga digital!

Agora eu chego ao topo das escadas e posso cumprimentar oficialmente o marinheiro. Aperto-lhe a mão.

- Olá, sou o cabo Sabino! Você será meu convidado pelos próximos dias.
- Olá Sabino! Sou Fernando, o repórter contratado pela marinha para missões secretas. Estou aqui para escrever sobre a parte real de toda esta ficção! Como conseguiram fazer isso tudo? É muito impressionante!

- É verdade! Não há como negar que trabalhamos bem nesta belezinha, né?
- Diga-me uma coisa, Sabino! Se as paredes externas deste barco são telas de televisão, então a embarcação não é blindada?

- É sim! Criamos um novo polímero..., um tipo de plástico, que recobre estas telas de leds. Além de serem resistentes a balas, ela não é reflexiva, ou seja, se alguém jogar uma luz em nós não brilharemos como na lataria de um carro. Se você olhar com uma lupa esta superfície verá que no interior deste polímero existem duas linhas distintas de leds. Uma é voltada para cima e produz imagens para enganar aviões, helicópteros e satélites. A outra linha é voltada para o horizonte onde produzimos imagens para enganar a visão das pessoas nas margens dos rios ou em outras embarcações.

- Impressionante!
- Com certeza! Vamos entrar, Fernando! Teremos muito que conversar durante a longa viagem de ida e volta. Você primeiro! (convida-me Sabino, afastando-se um pouco da entrada para facilitar meu acesso).

- Sabino, notei que o barco está apoiado, lá fora, parcialmente sobre o banco de areia! Como faremos agora para sair daqui?
- Este barco também é hovercraft!
- Hovercraft?!?!

- Sim! É um veículo que joga ar para baixo do casco. Uma borracha, disponível em toda a volta e sob toda esta estrutura de leds, mantém preso o ar insuflado ali. Isso ergue o barco, fazendo-o flutuar, nos livrando assim de atolar em terra ou em águas rasas.

- Incrível! (declaro eu).

Agora os degraus fecham-se novamente, articulando-se de volta, quando se encaixam perfeitamente na estrutura externa inclinada do barco. A porta também se fecha e tudo se oculta pouco antes da embarcação voltar a ficar invisível, tornando impossível que alguém nos visse parado neste local.

Já lá dentro, o ambiente nem se parece com o de um barco militar. O que mais vejo são monitores de TV de alta definição distribuídos pelas paredes. O estreito corredor de acesso me dá a impressão de estar no interior de um submarino. Chegamos logo depois até a primeira sala de trabalho:

- Esta é sala de controle técnico e manutenção onde eu e meu colega ali ficaremos a maior parte do tempo durante esta missão (comenta Sabino). Sou especialista em robótica e eletrônica e o cabo Everardo é expert em mecânica e nanomecânica (Sabino aponta para seu colega que está de costas para nós, analisando um monitor de vídeo quando chego ao local).

O cabo Everardo levanta-se de sua confortável cadeira e vem até mim para me cumprimentar.

- Olá, Fernando! Sou o cabo Everardo! Bem-vindo a bordo! Estamos cientes de sua missão e faremos o possível para tornar sua estada aqui a mais agradável possível.

- Se sua amiga sereia-anjo estivesse a bordo, tenho certeza de que a viagem seria ainda mais agradável (comento eu).

Todos sorrimos para a piada que fiz. Agora Sabino me convida para subir uma escada, ali mesmo, disponível na sala de trabalhos deles. É uma escada vertical de alumínio fixada no piso da embarcação e no teto, onde uma pequena abertura dá acesso ao andar superior. Aqui em cima há uma estação de batalha, onde ninguém se encontra. O cabo Sabino me apresenta as instalações:

- Esta é a sala de armas. Como vê,
estamos exatamente no centro
deste enorme local. As armas são
acionadas automaticamente pela
inteligência artificial do barco ou
pelos militares que estão na base
secreta em Brasília, através de seus
avatares aqui dentro.

Vejo alguns robôs industriais com
vários braços junto às laterais
internas da embarcação. Fico
espantado com aquilo! Sabino
percebe e me informa:

- Ali ao lado temos algumas
estações de trabalho robóticas para
manutenção de diversos
equipamentos do barco. Estes outros
braços robóticos alimentam as armas
de guerra durante uma missão. Nunca
faltam balas durante a ação. Temos
um grande estoque aqui mesmo,
neste local. Esta mesa vibratória organiza o posicionamento das balas sempre na mesma direção.

Olho para um dos recipientes, onde pequenas balas estão armazenadas, e percebo que são objetos metálicos simples e não se parecem com projéteis balísticos normais. Nem mesmo os canhões parecem ser convencionais.

- Sabino! Estou estranhando estas balas! Elas são meio diferentes!

- Sim, Fernando! Não há material explosivo nelas. São objetos metálicos compactos que são arremessados a alta velocidade por um canhão magnético. Podemos variar a velocidade do projétil para apenas matar uma pessoa a longa distância ou acelerar esta peça de ferro na mesma velocidade terminal que um meteoro cai na Terra. A aceleração é tão grande que este material explode como uma enorme bomba quando atinge um alvo! A destruição é inacreditável! Podemos criar um pequeno terremoto no local ou arrasar um bairro inteiro apenas com o impacto de uns poucos projéteis destes.

- Assustador! (declaro eu ao cabo).
- Conseguimos compactar bastante este novo conceito de canhão, o que propiciou diminuir o tamanho da embarcação. Com o auxílio dos braços robóticos e do tamanho reduzido dos projéteis, temos um poder de fogo inconcebível para nossos inimigos. Podemos manter uma guerra por um mês contínuo atirando sem parar dia e noite.

- Vocês chegaram a pensar em usar energia solar, eólica ou outra mais limpa?
- Sim! Tentamos usar energia limpa, mas a necessidade de ficar invisível tornou impossível o uso desta tecnologia. A captação de vento e de sol seria feita externamente, o que nos denunciaria para radares e aos olhos de nossos inimigos...! Ali atrás temos outro canhão! Este é de pulsos eletromagnéticos! Quando apontamos esta belezinha na direção de outro barco, fritamos todos os micro-chips do inimigo. Ou seja, o veículo para e só andará novamente depois de uma longa revisão! Temos todo este mesmo armamento voltado para o outro lado do barco. Assim podemos navegar entre dois barcos inimigos e atirar em ambos ao mesmo tempo, fazendo-os acreditar que um está atirando no outro. Na
popa*, na proa** e nas laterais do barco temos metralhadoras convencionais para atirar em alvos mais próximos durante o nosso deslocamento.

Percebo mais algumas portas fechadas ali por perto, que imagino são armários. Também noto o enorme salão sem nada no local. Durante esta viagem, descobrirei que naquele espaço vazio ficam dois estranhos robôs invisíveis, a respeito dos quais mais tarde serei informado. Havia também quatro motos estacionadas ali num canto da sala.

- Motos?!?! Num barco? (indago eu).
- Às vezes precisamos de um transporte pequeno e rápido para missões em terra.
- Missões em terra????
- Sim! Comprar comida, quando ela acaba, por exemplo! (responde ele de forma brincalhona). Elas estão aqui apenas se um de nós eventualmente precisarmos de um transporte rápido em terra.

Descemos de volta à sala de trabalho dos dois militares, pela mesma escada vertical. Havia mais uma escada do outro lado desta sala com acesso ao andar de baixo, mas não fui apresentado a ela naquele momento. Saímos do ambiente e continuamos andando pelo corredor até a parte de trás da embarcação.

- Este aqui é nosso refeitório! (mostra-me o cabo Sabino). Temos água que é retirada e purificada diretamente do meio aquático onde estamos. Portanto, não estaremos limitados pela falta dela. Já a comida está disponível apenas para os dias que levará esta missão. Depois disso teremos que pescar se quisermos comer mais alguma coisa. No final da cozinha, ali na parte de trás, estão os quartos, banheiro e chuveiro com água do rio também. Como o barco foi projetado para navegar sem tripulação, precisamos tomar cuidado com o consumo de água. A produção é contínua, mas é limitada a quatro pessoas. Se cada banho for longo demais não teremos água para beber por algumas horas até que o estoque seja reposto. Por isso o computador controla o tempo de água de cada banho. Cada um tem direito a uma quantidade específica. Depois disso o banho acaba, mesmo que você esteja ensaboado. Portanto, tome cuidado. Abaixo de todo este andar fica a sala das máquinas. Os enormes motores elétricos do barco podem nos levar por anos em diversas missões sem que precisemos parar.

- Os motores são elétricos? (questiono eu).
- Sim! São mais silenciosos, não aquecem tanto e nos deixam ocultos para as câmeras térmicas inimigas.
- Compreendo!

Andamos agora na direção contrária do corredor, atravessamos a sala que já me fora apresentada e chegamos à frente do barco.

- Aqui temos a cabine de comando e navegação. É onde tudo acontece. Acionamento das imagens de ilusão, camuflagem de invisibilidade, controle das armas, imagens de satélite, câmeras térmicas, tática e controle da missão. Se você gosta de ação é aqui que você deve se sentar e apreciar a vista.

Neste incrível ambiente eu me assusto! Posso ver pessoalmente os avatares que o pessoal da central comentou. São enormes seres metálicos controlados pelos militares da base secreta em Brasília. Eles têm quatro câmeras em suas cabeças, posicionadas noventa graus horizontalmente umas das outras, para poderem olhar em todas as direções ao redor, não precisando assim de muito movimento de pescoço. O corpo forte lembra um robô que toma anabolizantes! Cheios de músculos artificiais, os poderosos seres parecem prontos para uma luta corpo-a-corpo! Eles lembram um humanoide com alguns detalhes como pés e mãos que funcionam de forma muito similar a nós. Inesperadamente todos os cinco avatares me cumprimentam. As vozes dos militares que encontrei em Brasília, na central de comando, saem do interior da cabeça robótica.

- Olá, Fernando (comentam todos eles juntos).
- Bem-vindo à missão-fantasma que se iniciará em cinco minutos (declara a Major Margarida). Relaxe e aproveite! Se tudo der certo será uma missão longa, mas bem tranquila.

- Ahh! Sim! Obrigado, senhores e senhorita. A imagem de seus avatares e do interior desta embarcação é impressionante! Estou abismado com o tamanho deste empreendimento!

- Vou deixar vocês à vontade aqui! (comenta o cabo Sabino saindo da cabine de comando). Fernando, se precisar de mim estarei circulando por todo o veículo. Tenho muito que checar e testar durante as primeiras horas desta missão.

- Obrigado Sabino pelo rápido tour! (comento eu, Fernando, a ele).

Agora o cabo bate continência para os avatares que o liberam:

- À vontade, cabo! (declara a major Margarida).

Esta é uma cena engraçada e ao mesmo tempo ridícula! Por que alguém faria isso às máquinas? Claro que sei que os avatares são controlados por militares reais e que são superiores ao cabo. Mas vendo isso acontecer ali..., ao vivo..., me pareceu algo desproposital. A tecnologia propicia estranhas mudanças no comportamento humano!

- Onde está o avatar do comandante? (questiono eu a major Margarida).
- Estou aqui, Fernando! (responde o comandante, enquanto olho ao redor à procura da origem da voz). Não preciso de um avatar. Apenas comando daqui da base a operação, enquanto minha equipe torna possível que toda a ação aconteça. Portanto, você apenas ouvirá minha voz através dos alto-falantes da embarcação.

- Certo! (declaro eu, meio sem jeito). Comandante! Quem projetou o sistema de invisibilidade deste barco?

O militar responde minha questão, enquanto percebo que a voz dele vem realmente do sistema de som interno do barco.

- Todo o conceito veio de um trabalho de formatura de dois universitários. E você acaba de conhecer ambos pessoalmente no interior desta embarcação.

- Sabino e Everardo?
- Exatamente.
- Eles me pareceram bem empolgados com toda esta tecnologia aqui.
- É verdade! São os mais dedicados de toda a equipe. Às vezes precisamos dar a ordem de dispensados duas vezes. Eles não querem parar de trabalhar! Afinal, demos-lhes total liberdade para criar e desenvolver o projeto do barco invisível (comenta o comandante).

Agora Severo volta-se para seu grupo militar e finaliza a minha visita, dando início oficial à missão-fantasma:

- Muito bem, pessoal! Quero agradecer antecipadamente ao trabalho de todos vocês! Esta será a nossa primeira missão oficial com o barco invisível. Baseado em todo o planejamento detalhadamente estudado, testes realizados e dedicação de cada membro de nossa reduzida equipe, já que ninguém de fora poderia trabalhar diretamente na fabricação desta embarcação..., tenho certeza de que o resultado final da primeira missão-fantasma será um sucesso! A primeira de muitas para eliminarmos de vez o mercado de tráfico de drogas neste continente. Traficantes e guerrilheiros aprenderão a temer o fantasma que amaldiçoará todos aqueles que se meterem com a produção e venda de drogas na América do Sul. Preciso da dedicação integral de cada membro desta tripulação, tanto para garantir a vida de nossos três homens a bordo, quanto para restabelecer a paz e a soberania do Brasil na tríplice fronteira, foco desta missão! Sei que farão o melhor de vocês, porque precisamos deste melhor! Esta primeira missão determinará se nossos conceitos de trabalho e decisões técnicas foram as abordagens mais adequadas a serem utilizadas daqui para frente. Eventuais alterações e novas programações oficiais poderão ser produzidas para que na próxima missão não precisemos enviar mais ninguém a bordo. Vamos lá pessoal! O país nos chama à luta para acabar de vez com o tráfico de drogas e guerrilheiros neste continente!
Pelo Brasil, por nossos filhos e pela paz nas ruas! (grita o comandante ao final de seu curto discurso).

-
Pelo Brasil, por nossos filhos e pela paz nas ruas! (gritam todos da equipe).

Percebo que, muito mais do que um projeto naval de guerra, este é um momento único onde estes militares se unem, juntamente com o poder público, para por um fim definitivo aos cartéis de drogas e produtores de plantas proibidas.

É algo mágico e que me comove. Sei que estou participando de algo especial! Um instante único da história onde poucos profissionais e muito dinheiro estão sendo usados com o intuito de tornar a vida das pessoas nas cidades e no campo mais segura, mais tranquila, mais digna. Sem as drogas restarão apenas os tumultos e assaltos a serem combatidos, porque todo o restante sempre foi, de uma forma ou de outra, financiado pela venda de maconha, craque, cocaína e outros produtos inúteis! Com a dificuldade de produção e tráfico, os usuários simplesmente não poderão mais pagar por um produto tão caro. A vida humana está para mudar a partir daquele momento. Mas para isso a primeira missão-fantasma deve funcionar!

- Soldado Ricardo! O que o satélite da marinha diz a respeito da proximidade de seres humanos?
- Nada, comandante! Não há ninguém até dois quilômetros de distância de nós! (responde o soldado Ricardo).
- Major! Acione o sistema hovercraft para sairmos deste porto (ordena o comandante a oficial e piloto Margarida).

Assim que a profundidade deste braço de rio permitir, vamos usar a propulsão central. Não queremos ser vistos na região mais populosa do Amazonas (fala o comandante sobre a cidade de Manaus).

CAPÍTULO VII
A ÉTICA ASSASSINA

CAPÍTULO VIII
MOTIM

CAPÍTULO IX
NA LINHA DE FRENTE

CAPÍTULO X
A INVASÃO DO PERU

PERSONAGENS DESTE LIVRO/
CONCEITO DE INVISIBILIDADE

* A popa do barco é a traseira dele. Por isso existem motores de popa.

** A proa de uma barco é a frente dele. Normalmente onde fica a cabine de comando.

- Sim, senhor! Sistema hovercraft acionado (responde ela).
- Soldado Carlos! Mantenha de agora em diante a invisibilidade sempre acionada até que eu requisite algo diferente disso! (ordena o comandante).
- A invisibilidade está acionada, senhor! (informa Carlos).

- Soldado Ricardo! Quero uma varredura completa de toda a região num raio de dez quilômetros. Vamos passar o mais longe possível de todas as embarcações e também devemos ficar bem longe das margens! Não quero que um erro de paralaxe denuncie nossa posição a ninguém!

- Acionando o Programa 1 de navegação em rios, senhor! (responde Ricardo).

Na tela de navegação surge o Rio Solimões e vários pontos luminosos que indicam a posição das diversas embarcações existentes na região. Uma linha digital é traçada para que o barco invisível possa ficar o mais longe possível dos olhares do mundo exterior. A Major trava o programa em sua tela e pressiona o piloto automático que começa a seguir lentamente a rota traçada pelo computador.

- Soldado João! Faça seu trabalho! Use as câmeras de vigilância externas! Se alguém olhar mais nitidamente em nossa direção corrija o paralaxe, acertando o posicionamento da imagem para evitar que sejamos descobertos.

- Sim, senhor! Afirmativo (responde João).
- Soldado Carlos! A Major lhe dirá o momento correto para acionar os programas visuais requisitados. Fique atento!
- Sim, senhor! A postos! (responde Carlos).

- Tenente Júlio fique de prontidão para qualquer eventualidade (ordena Severo). Não acredito que precisaremos tão cedo de nossas armas, mas não podemos ser pegos de surpresa por ninguém. Surpresa é nossa maior arma e não pode ser a nossa fraqueza numa missão!

- Sim, senhor! (responde Júlio).
- Cabos Everardo e Sabino! Façam os check-ups em suas áreas de atuação de hora em hora, como combinado para o início desta primeira viagem.

- Sim, senhor! Estamos cientes! (responde Sabino em nome dos dois que estão juntos na sala de manutenção).

- Jornalista Fernando! Conte esta história que começa agora! (requisita o comandante). Ou seremos todos lembrados como heróis no futuro ou apenas como um pequeno grupo que achou que poderia mudar o mundo!

- Sim, senhor! Fique tranquilo! Direi apenas o que eu vir aqui! (respondo eu, Fernando).
- Major! Quero a velocidade máxima assim que tivermos espaço disponível para isso (ordena o comandante). Vamos adiantar nosso cronograma. É melhor ficarmos esperando de tocaia por alguns dias do que chegarmos atrasados aos locais de ataque.

- Sim, senhor! (confirma Margarida).

- Bem, Fernando! Agora é com você! Caso tenha alguma dúvida consulte qualquer membro de nossa equipe presente. Mas lembre-se sempre de que sua função aqui é principalmente de observador! Portanto, tome muito cuidado para não desviar demais a atenção de meu pessoal nos momentos mais críticos desta missão. Durante nossos trabalhos não precisamos liberar o áudio de nossas conversas a bordo. Mesmo assim vamos mantê-lo disponível no interior do barco, enquanto vocês estiverem acordados, para que cada um de vocês possam saber de tudo o que está acontecendo.

- Obrigado, senhor! Vou acompanhar um pouco as coisas por aqui e depois visitarei Sabino e Everardo!

Agora eu, Fernando, posso observar melhor os avatares produzidos em metal e plástico. Aproximo-me deles e noto os detalhes de como foram feitos. Agacho-me ao lado do avatar que pilota o barco e noto o funcionamento de pequenos motores elétricos e minipistões hidráulicos e pneumáticos daquele corpo incrível! É uma maravilha tecnológica.

Cada vez que um dos militares clica num botão lá na central de controle em Brasília, o corpo do avatar responde aqui no barco, repetindo o mesmo movimento. Na verdade este é o conceito de avatar. A major Margarida, através de suas câmeras instaladas na cabeça artificial do avatar, percebe meu olhar atento aos detalhes do corpo artificial e comenta comigo:

- Fernando! Eu poderia registrar uma queixa por tentativa de assédio sexual, de tanto que olha para mim!
- Oi...? O quê...? Não...! Por favor...! (comento eu, sem jeito). Só estou observando o corpo maravilhoso do avatar sob seu controle. Não quis ser indelicado!

- Relaxa, jornalista! Estou apenas brincando com você! Rsrsrs! (declara ela).

- Eu não sabia que a robótica tinha atingido um nível tecnológico tão avançado! (comento eu). O funcionamento das mãos e dos braços é extremamente preciso! Os gestos são incrivelmente similares aos humanos! Estou me sentindo numa nave espacial alienígena! É até meio assustador!

- Senti algo similar também quando estive a bordo na primeira vez! (comenta a Major Margarida). Mas agora, usando estes óculos de realidade virtual, que misturam imagens reais com computação gráfica, sinto-me como se tivesse um poder incrível em minhas mãos! Parece um vídeo-game extremamente sofisticado e que pode matar muita gente se eu fizer algo errado. É excitante e ao mesmo tempo assustador!

- Imagino como possa ser isso! (comento eu, finalizando as observações detalhadas sobre o corpo do avatar, enquanto me ergo novamente, ficando em pé). Major! Como podemos ter certeza de que a nossa invisibilidade está funcionando?

- O computador faz amostragens dos leds externos em funcionamento para confirmar se estão mostrando exatamente o que deveriam mostrar! (comenta a Major). Após fazer milhares de testes simultâneos temos a confirmação de que tudo está como deveria estar. Mas se quiser ver com seus próprios olhos podemos mostrar a visão externa para você.

- Sim! Eu gostaria muito disso! (respondo eu).

A Major, lá na central em Brasília olha diretamente para o soldado João e dá a ordem:

- Voyeur! Libere nosso inseto artificial invisível para um giro ao redor da embarcação.

O soldado João, o voyeur, sorri, lá na central para a major Margarida, e pressiona um botão no painel à frente. Rapidamente uma pequena portinhola se abre no topo do barco invisível. Dali sai voando um tipo de libélula plástica invisível enorme. Ela é muito proporcional ao tamanho do inseto real.

A câmera de ré do inseto mostra de onde ele sai. Posso perceber que nada se vê abaixo sobre a água do rio. Estamos realmente invisíveis para qualquer um que nos olhe. A única coisa que noto é um pequeno movimento de ondas geradas pelo deslocamento do barco invisível e um ligeiro reflexo diferenciado na água.

- Incrível, Major! Como vocês conseguem se deslocar disfarçando tão bem a
esteira* de água?

- Nós temos quatro tipos de propulsão naval, Fernando. São dois motores de popa para maior velocidade. Temos o sistema hovercraft para flutuar como um colchão de ar. Dispomos de dois foguetes de propulsão, que ainda não foram adequadamente testados. E o quarto sistema que é este motor central sob o casco que joga a água para trás e ligeiramente para baixo. Isso ajuda a esconder a esteira atrás da embarcação e é o único meio de propulsão que devemos usar, se quisermos nos esconder! Já em alta velocidade não é possível esconder a esteira de água!

- Entendo! Vocês estão sempre me surpreendendo aqui!
- Esse é a função principal do barco invisível: surpreender nossos adversários e parceiros.
- E este inseto artificial voador?!?! O que é?!?!

- Exatamente o que você disse: um inseto artificial voador com uma câmera à frente e outra a ré. Ele tem um microfone supersensível, o que nos ajuda a ouvir o que as pessoas estão conversando, desde que estejam até a cinquenta metros de distância! Este robozinho também tem um GPS interno e um sistema de medição a laser de distâncias, além de ser controlado daqui, por nós, pela inteligência artificial ou com a programação interna.

Agora o computador do barco
se pronuncia pela primeira vez
com voz feminina e suave:

- Finalização do Programa 1 em
trinta segundos. Entre com um
novo programa ou dirija a
embarcação no modo manual.

A major pega novamente no
joystick de controle de navegação,
preparando-se para navegar no
modo manual.

- Muito bem, senhores! Agora
vamos usar a imagem do pequeno
barco com motor de popa (declara
a major e piloto Margarida).
Soldado Ricardo, algum olhar
humano ao nosso redor?

Ricardo observa os sinais das
câmeras térmicas do satélite militar
brasileiro, voltado exclusivamente
para a missão-fantasma, e responde:

- Não, major! Não há ninguém num raio de cinco quilômetros daqui. Pode proceder à mudança de imagem no casco externo da embarcação.

- Cineasta! Imagem do pequeno barco com motor de popa em 5..., 4..., 3..., 2..., 1..., agora!
- Pronto, major! (responde o soldado Carlos, o cineasta). Imagem de barco com motor de popa disponível, aguardando acionamento dos nossos motores de popa.

A major aciona alguns botões em seu painel de controle e o barco para de andar, recolhendo o motor central.

- Ok, senhores! (ordena ela). Vamos começar a ganhar tempo aqui.

A moça aciona com a mão esquerda o acelerador manual, forçando-o para frente, similar ao de um avião. Lá fora a esteira branca de água começa a se formar atrás do barco invisível (na popa) e a imagem virtual da embarcação a motor se inclina ligeiramente para cima, como faz um veículo deste tipo quando em velocidade na água.

Para quem olha de fora o resultado é impressionante! Eu, Fernando, ainda observo o que está acontecendo através da câmera da libélula artificial e percebo que os sistemas real e virtual se integram com perfeição, iludindo qualquer um que esteja próximo dali.

- Recolher câmera aérea! (declara a
major Margarida ao soldado João - o
voyeur).
- Recolhendo câmera aérea (informa
o soldado João).

O inseto invisível aéreo voa
rapidamente para o topo da
embarcação invisível. Lá no alto a
portinhola novamente se abre,
deslizando para o interior da
superfície, onde agora pousa o
falso inseto. A portinhola se fecha
e nossa embarcação começa a
singrar as águas do Rio Solimões
em velocidade.

A imagem virtual, projetada na
parte de fora de nosso barco,
agora transformado em uma
lancha, mostra duas belas
ocupantes usando biquínis com
seus cabelos esvoaçantes ao
vento enquanto nos deslocamos.
Uma bela ilusão para enganar os mais desavisados!

- Por que a imagem mostra duas mulheres, uma loira e outra morena pilotando uma lancha? (pergunto eu, Fernando, ao Cineasta Carlos).

- Nós imaginamos que nenhum inimigo atiraria num barco a motor se duas belas mulheres estivessem pilotando! (responde o soldado Carlos).

- Vocês pensaram em tudo mesmo, não é? (comento eu).
- Esperamos que sim, Fernando!
- Mas e se alguém atirar, mesmo assim? (indago a ele).

- Aí finalizamos o programa, fingindo que o barco explodiu e afundou. Aparecem destroços na tela, enquanto desaceleramos o barco invisível para que a esteira não nos denuncie mais. O inimigo acreditará que destruiu o barco a motor virtual, enquanto passamos lentamente por ele em velocidade baixa com a propulsão central. Nunca encontrarão nenhum destroço e em poucos minutos estaremos bem longe dali.

- Bem engenhoso o plano! (comento eu).

Daqui em diante o barco invisível andará um bom tempo com a imagem virtual das duas garotas pilotando um veloz barco a motor, que aparece numa das telas internas também. O Rio Solimões é muito grande e teremos um bom caminho pela frente.

- Não vi nenhuma janela ou escotilha no casco externo do barco invisível. Estou enganado?

- Não, Fernando! (responde o comandante do navio apenas em forma de áudio para mim). Se houvesse janelas não poderíamos recobri-las com a tela de leds e isso denunciaria a nossa presença. Temos que pilotar este barco através de câmeras de vídeo, sensores, radares, satélite e GPS, como num submarino.

- Então só saberemos se é dia ou noite olhando para as imagens nos monitores e para meu relógio? (comento eu).

- Sim! Exatamente, Fernando! (finaliza o comandante).
Estou muito interessado em tudo o que está acontecendo, mas confesso que olhar para a mesma imagem de um barco singrando as águas do Solimões por horas, não dá para aguentar! Cansado pela falta de novidades resolvo visitar Sabino e Everardo na sala deles.

- Pessoal! Vou dar uma volta e comer alguma coisa (comento eu, já saindo da sala de controle). Eu os convidaria, mas avatares não se alimentam, né?

- Rsrsrs! Fique à vontade, Fernando! A comida a bordo é toda para vocês (declara o comandante).

No caminho para a cozinha atravesso a sala de Sabino e Everardo que estão tão agitados fazendo check-ups, que nem me viram por ali. Resolvo continuar pelo corredor até encontrar a pequena cozinha a bordo. Ao chegar ao local olho para a porta da geladeira onde há um recado colado nela: “favor consumir primeiro as frutas que se estragam mais rapidamente. Comandante Severo.”

Sorrio, porque todos da equipe se preocupam com os mínimos detalhes da missão. Tudo isso me dá muita confiança de que o resultado final será favorável à missão-fantasma. Abro a geladeira e pego uma maçã para comer. Na parede ao lado vejo uma tampa onde está escrito sutilmente: “assento”. Agarro o puxador e a tampa se abre para baixo, se transformando num assento de banqueta ao lado da mesa.

Mas quando eu a solto ela se fecha novamente. Puxo-a para baixo outra vez e me encosto rapidamente nela, para garantir que desta vez eu possa me sentar ali. Deu certo! Numa embarcação de alta tecnologia estou tendo problemas com um simples assento de banqueta! Sinto-me meio ridículo neste momento, mas, enfim, ninguém viu a cena.

Olho para uma tela de cristal líquido na parede à minha frente e vejo a imagem da proa (proa é a parte de trás do barco). A esteira branca em movimento sobre a superfície calma do Rio Solimões. O interior do barco é altamente silencioso e não se pode ouvir dali o som das hélices, dos pássaros, macacos ou das águas movimentadas pelo veículo invisível. Como então calmamente aquela maçã entre diversos pensamentos longínquos.

Olho meu relógio e percebo que já era a hora da troca de turno dos militares da sala de comando! Acelero meu passo para ver pessoalmente como será feita tal coisa, que acontecerá na realidade apenas lá em Brasília, no centro secreto de comando. Observando os avatares percebo que nada acontece durante a troca de turno. Ouço as vozes de todos os meus conhecidos e também da nova turma que está entrando.

Os avatares continuam na mesma posição de trabalho: sentados e com os braços sobre o painel enquanto acionam os diversos controles. Todos falavam muito e percebo pelo áudio que estão fazendo um rápido relatório da situação, cada um sobre seu próprio posto de trabalho ao outro militar que assumirá o controle. Termino de comer minha maçã e a comunicação entre eles não cessa.

Noto que discutem detalhes técnicos e falam dos programas que já utilizaram até ali, tanto os visuais externos quanto os programas de navegação. Depois descobri que, durante a troca de turno, a inteligência artificial assume momentaneamente os controles dos avatares, liberado pelos militares. Ao oficializarem a troca de turno os jovens profissionais reassumem tudo novamente.

Um incrível trabalho de equipe entre homens, mulheres e máquinas inteligentes. Parece que será uma longa e calma viagem para mim e bastante agitada para todos os militares. Dá para perceber a preocupação de todos em conseguir fazer um excelente trabalho.

Esta é a primeira grande missão daqueles jovens e desta embarcação. E eu sou o responsável em mostrar, com a maior fidelidade possível, esta incrível etapa da história humana que se desenrola aqui..., diante de meus olhos!

Fico emocionado neste momento, que se tornará inesquecível do meu ponto de vista. Muitas trocas de turno acontecerão durante a viagem, mas esta primeira está sendo reveladora e marcante.

Diversos minutos se passam e ninguém nota a minha presença discreta ali atrás. Percebo que a turma que saiu demorou para ir embora. Parecia que eles esperam para ver se tudo correria normalmente.

E tudo ocorre realmente de forma tranquila. Quando a primeira equipe vai toda embora, o comandante, que ainda era naquele momento o Severo, me apresenta o pessoal que assumiu os postos. São muitos nomes para decorar. Nomes sem rosto, porque estou diante apenas dos avatares e posso ouvir as vozes dos militares que assumem seus postos.

A noite cai e nada de novo acontece lá fora. Apenas pequenos barcos que passam ao longe, grupos de indígenas à beira do rio, barcaças de turistas ruidosos que passam por nós e pescadores em pequenas jangadas ou barquinhos a remo. Nenhum deles parece nos notar enquanto passamos.

Somos fantasmas flutuando rio acima em busca da origem dos problemas das drogas, que se disseminam de forma muito similar por todas as grandes cidades do mundo atual. Iremos cortar a raiz de todos esses males. Estrangular o comércio mundial da maconha, cocaína e craque.

Com certeza os preços subirão nas ruas ou seus produtores mudarão de continente, se quiserem continuar plantando. Estamos para dar um grande basta nesta porcaria que assola milhares de famílias em todo o mundo. O tempo passa excessivamente calmo e, já tarde da noite, resolvo dormir para encarar o próximo dia sobre as águas.

Desloco-me até o local que chamam de dormitório coletivo. Ao me deitar, me sinto como uma sardinha numa lata fechada. Tudo muito apertado e com pouco conforto disponível. Talvez um avatar ficasse feliz de tirar uma soneca ali, mas um jornalista, não! Os outros dois militares a bordo, os cabos Sabino e Everardo, continuam incansáveis em seus trabalhos.

Eu mal os vi neste dia e tampouco consegui conversar com eles também! Entre novos pensamentos e elucubrações sobre como eu montarei meu documentário em vídeo e escrito sobre tudo o que vi aqui, acabo dormindo. Um sono profundo porque o movimento suave da embarcação torna-se um convite ao relaxamento.

* Esteira, no jargão naval, é o rastro branco sobre a superfície da água que fica atrás de um barco,
portanto, na popa da embarcação, logo depois do sistema de propulsão, seja ele à hélice ou a jato.

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